domingo, 1 de agosto de 2010

Louvre e o muçulmano.

Hoje sentei na frente do computador sem saber o que escrever.
Mas a vontade eu tinha.
Passei mais de um mês sem postar algo por aqui em meu querido blog.
Às vezes fico pensando no motivo pelo qual criei isso. Porque sinceramente eu não acredito que as pessoas passem por aqui com grande frequência.
Acho que criei pelo simples fato de gostar de escrever, mesmo que de forma amadora.
E eis que hoje foi a primeira vez que entrei sem pensar em nenhuma viagem que eu tenha feito. Não consegui lembrar, fiquei olhando fotos, pensando em algo produtivo e diferente.
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Então comecei a lembrar do cheiro que tem o museu do Louvre, em Paris. Ele cheira a antiguidade, ao mesmo tempo em que cheira àquele móvel de madeira novo. Engraçado. Os cheiros se misturam e sempre me lembram algo que não seja lá muito concreto. As pessoas costumam chamar a isto de sinestesia.
Mas voltando ao assunto, o que gosto muito do museu é a sua diversidade.
Quando fui, encontrei um muçulmano, de turbante e tudo (digníssimo) vendo a Mona Lisa. Ela sorria para ele, com aquele pseudo-sorriso que só ela sabe ter. Ele olhava, talvez pensando "é isso que os ocidentais tanto falam?". Porque eu não vi nenhuma expressão querendo aparecer nele.
Ele simplesmente olhava, como se ali estivesse uma parede branca. Ficou parado uns poucos segundos. Eu só o vi de relance, estava bem cheio. Mas de toda forma, foi o que me pareceu. Indiferença. Achei estranho, não havia ninguém ao seu lado (muçulmanos raramente viajam e, quando o fazem, é sempre com muita gente).
Senti uma enorme vontade de para-lo (não no sentido literal, mas no sentido de tira-lo de seus pensamentos), somente para perguntar em alguma língua que ainda não sei, "O que o senhor está pensando? Satisfaça uma curiosa, por favor."
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Depois disso comecei a pensar, porque às vezes eu tenho esse hábito.
Presenciei algo que pensei que não existisse: o costume dos povos, todos misturados. Em um local que tem por finalidade guardar monumentos/pinturas/roupas/artefatos de nações e civilizações. Lá, vão pessoas; todas elas bem curiosas de ver não-sei-o-quê. Sentam-se, ficam olhando, pensando; fazendo cada um de seus neurônios elaborarem ou, ao menos, assimilarem um pouco do mundo. Mas tudo é bem mais complexo do que somente olhar e pensar. Ali estão marcas, estão partes de pessoas. Marcas de épocas... e sofrimento, e alegria, e criatividade, e expressão. (sim, com todos esses E's com vírgula, bem no sentido de somar, de agregar)
De repente, um muçulmano que reza cinco vezes ao dia virado para Meca, que não aceita que sua mulher use outra coisa na rua senão uma burca, fica tête-à-tête com Mona Lisa. Ela, que nem nós, Ocidentais, conseguimos compreender. Sabemos como é misterioso o porquê de Mona Lisa, o motivo. Muitas histórias giram ao redor daquele pseudo-sorriso. O muçulmano então, coitado.
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O choque de culturas, entendem? A mistura entre elas. Isso tudo me deixou maravilhada!
Ele já deve ter ouvido falar, em algum momento. Deve ter visto em alguma foto. Devem ter dito a ele "olha, essa é a maior obra do mundo!". Ele, que não aceita que seu Deus apareça com o rosto em obras de arte, que não vive sem seu Alcorão, quem não consegue cumprimentar alguém sem dizer Salaam Aleikum.
"Ele deve ter dinheiro..." - foi o que pensei.
Muçulmanos têm muito dinheiro. Não todos, mas os que viajam têm. Vi vários, andando juntos. Muitos inclusive de mãos dadas (entre eles não há preconceitos, a cultura não implantou isso em seus cotidianos, amizades e relacionamentos - pelo menos não esse tipo de preconceito, se é que vocês me entendem). Com os bigodes, as barbas. As mulheres, de burca. Detalhe: todas ornadas de Victor Hugo e Armani.
Mas o fato é: ele se deixou levar por uma cultura que não é a dele. Deixou-se levar e estava lá, entre as pessoas. Pode ter sido por curiosidade, isso é verdade. Pode ter sido por um impulso, por um momento. Mas, de uma forma ou de outra, ele se encontrou com o lado desconhecido. Ele permitiu-se encontrar com o desconhecido.
Não que isso tenha mudado a vida dele, mas o mundo com certeza ficou um pouco mais tolerante. Da mesma forma que tenho minhas dúvidas... será que alguém, católico-apostólico-romano-com-tudo-dentro iria à Meca?
Vale a pena misturar, vale a pena permitir que um pouco do outro entre em nossas cabeças. Não é tão difícil, é só deixar.
Viajar é muito construtivo, eu já disse isso?